Monday, December 10, 2007

DIE LISTE #41

Anima Sound – “Stürmischer Himmel” (1971)

Um homem nú pairando sobre as núvens; uma mulher fálica de bronze negro, equilibrando-se na bacia exposta do homem; à sua volta, esferas solares ostentando os nomes do casal, Paul e Limpe Fuchs; tudo isto exposto através de uma abertura de perímetro circular que rasga uma primeira camada de céu mais tempestuoso. “Stürmischer Himmel” é o disco dos Anima Sound, editado pela Ohr Records, em 1971, com a capa que se acabou de descrever e é o primeiro álbum do duo composto pela artista pluridisciplinar e multi-instrumentista Limpe Fuchs e pelo escultor, seu marido, Paul Fuchs. Desde os anos 60 que estavam envolvidos na dinâmica fértil e contra-cultural que emanava de Munique e, ainda que os seus anárquicos trabalhos musicais estivessem mais próximos da radicalidade experimental do free jazz, a sua obra acabou por influenciar o rock underground de que já faziam parte os seus conterrâneos Amon Düül, sendo por isso comum encontrá-los associados ao krautrock, embora pouco houvesse de rock na sua música. Esta torna-se mesmo de escuta difícil para quem procura nela uma estrutura melódica ou rítmica. De base claramente improvisacional, esta música é dominada pelo estilo percussivo e pelos sons vocais inarticulados de Limpe Fuchs, secundada pelos instrumentos de sopro do parceiro. Em termos tímbricos, a originalidade dos Fuchs deriva não só da forma inusitada de percutir e soprar os instrumentos mas também do facto de prepararem e transformarem os instrumentos de um modo novo, que lhes permite denominá-los a partir do seu próprio nome, surgindo assim o fuchszither, o fuchsbaixo e a fuchstrompa. Neste disco, a estranheza sonora é ainda agravada pela inclusão de gravações de campo, captadas tanto em espaços bucólicos e rurais como na cidade industrial e habitada pelas vozes humanas.
Primitivo e ao mesmo tempo vanguardista, o primeiro disco dos Anima foi gravado num casebre, alegadamente com cerca de 1000 anos de idade, junto de Peterskirchen, uma localidade nas imediações de Munique. Aí terão instalado e modificado os seus instrumentos acústicos e a sua aparelhagem electrónica que contribuíu subtilmente para o seu som inovador. A primeira faixa, Show Mää show, começa com o ruído que o vento provoca no microfone e com o balir de uma ovelha até que, exactamente, ao primeiro minuto surgem as percussões e o deslize grave do fuchszither. Pouco depois, way on way up, vêm os gritos, os soluços e o trautear ininteligível de Limpe, acompanhados pela corneta de Paul, num crescendo de intensidade e movimento rítmico. “It loves” parece retomar onde a peça anterior havia ficado, como transição quase jazzística, para a improvisação e o freak out que finaliza o lado A, com “Feel like a bone”. O lado B tem apenas duas faixas, “How to dream”, com um ritmo mais hipnótico e “The Weather”, a última e também mais longa, com espaço para algumas gravações de campo, criando a impressão por vezes de um álbum gravado ao vivo. Em fundo, escutávamos já a primeira faixa do lado A, fiquemos agora com Feel like a Bone e as suas subsecções Rückopplung, Good Vibration and Happiness Gone.

Tracklist:

Lado A

1 Show Mää show (9:11)
123 Way on way up
209 meau
286 It loves -
Want to've done it (2:50)
367 Crazy crying
391 feel like a bone (6:04)
433 Rückkopplung
487 Good Vibration

Lado B

1 Happiness gone
83 How do dream - You (6:39)
116 Ha Ha
190 Müllabfuhr
235 Viktualienmarkt
390 The weather (12:09)
624 Kommunikation

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Tuesday, December 04, 2007

DIE LISTE #40

Kluster – “Klopfzeichen” (1970)

Klopfen klopfen klopfen... é um repetido e rítmico bater metálico que se ouve do princípio ao fim deste disco, como um sinal que anuncia a chegada, o advento de uma revolução social ou simplesmente a vinda de uma nova e prolífica era de produção musical alemã. Porém, a escuridão apocalíptica que ensombra a música aqui apresentada pelos vanguardistas e pioneiros do krautrock parece, ainda, fazer ecoar essas marteladas fatídicas que, alegadamente, cravaram um dia o verbo feito carne no lenho da cruz erguida no Monte Golgotha. Mas estas especulações não parecerão tão estranhas se revelarmos que o título deste álbum de 1970, “Klopfzeichen”, o primeiro do projecto seminal Kluster, é muito possivelmente um jogo de palavras com a expressão “Kreuzzeichen”, isto é, o “sinal da cruz”. E fazem ainda mais sentido se soubermos que as gravações no Rhenus Studio foram promovidas e patrocinadas por uma igreja progressista, cuja editora, a Schwann, especializada em música religiosa, editou o primeiro e o segundo álbuns da banda formada por Conrad Schnitzler, Hans-Joachim Roedelius e pelo suíço Dieter Moebius. O conteúdo religioso dos textos aí lidos por Christa Runge foram a contrapartida do acordo feito entre o grupo e essa igreja que tornou possível o registo e edição do início promissor de Kluster, o projecto que se manteria um trio ainda no segundo álbum, mas que, depois de Zwei – Osterei, com a saída de Conrad Schnitzler se tornaria um duo e veria o K do seu nome transformar-se num C. Os textos de pendor religioso não tinham, no entanto, um carácter dogmático, antes pelo contrário, eram poemas de carga revolucionária e até libertária, escritos por poetas radicais e teólogos como Dorothee Sölle, Liselotte Rauner ou Uwe Seidel, para citar apenas alguns, em consonância, aliás, com a vocação experimental e vanguardista do trabalho musical ali apresentado.
Estas aventuras musicais de Schnitzler e Roedelius haviam começado anos antes, em projectos como Plus/Minus ou Noises, e intensificaram-se em 1968 quando formaram o Zodiac Free Arts Lab, um clube instalado nas traseiras do Schaubühne, teatro e bar situado no lado oeste de Berlim, onde se experimentavam sons psicadélicos, de vanguarda e free-jazz, e onde se exibiam as novas energias criativas do underground berlinense. Com o encontro de Dieter Moebius, um estudante da Academia Gráfica de Berlim, formou-se então o Ensemble Kluster. As experiências deste projecto caracterizavam-se por longas improvisações ao vivo, onde não se utilizavam apenas os instrumentos tradicionais, acústicos e eléctricos, mas também despertadores ou utensílios de cozinha, no espírito talvez herdado de Joseph Beuys, de quem Schnitzler havia sido aluno na escola de Belas Artes de Düsseldorf.
O ambiente sonoro criado em Klopfzeichen é pesado e industrial, abundando as percussões metálicas, os feedbacks, a reverberação constante e os efeitos de estúdio de Conrad Plank, o outro nome lendário a participar neste disco, que contribuíu inequivocamente, neste trabalho, para inscrever a influência de Karlheinz Stockhausen e das experiências do grupo italiano Nuova Consonanza, também ele profundamente marcado pelos caminhos musicais do compositor alemão, como é citado nas próprias notas do disco. Este é composto por duas partes apenas. A primeira, que preenche o lado A, cria a banda sonora que suporta a leitura dos textos já referidos. A segunda, é apenas instrumental, explorando de uma forma mais livre e dinâmica as possibilidades oferecidas pela tecnologia das câmaras de eco, dos loops da fita magnética e os clusters do piano, que enche o lado B do disco que escutamos já em fundo. Antes de escutar um excerto do lado A, uma nota final para dizer que o disco foi gravado em 21 de Dezembro de 1969, a data do solistício de inverno, que em tempos romanos marcava as festividades do culto pagão ao Sol Invictus, adaptadas à religião cristã, depois da conversão do Imperador Constantino, como celebração da Natividade de Cristo. Uma ocasião cósmica, portanto, a marcar o início de um dos nomes mais importantes do krautrock.

Tracklist:

Lado A
Kluster 1 (23:31)

Lado B
Kluster 2 (21:34)

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