Friday, March 21, 2008


DIE LISTE #45

Brave New World – “Impressions on Reading Aldous Huxley” (1972)

“Oh, que prodígio! Quantas soberbas criaturas aqui vivem! Como é bela a humanidade! Oh, admirável mundo novo, onde tal gente habita!”, exclama Miranda ao ver pela primeira vez outros homens, na ilha onde vivia exilada desde criança com seu pai, Próspero, na 1ª cena do Acto Vº de “A Tempestade” de William Shakespeare. E a exclamação repete-se quando John the Savage se confronta com esse “admirável mundo novo” de que Linda, sua mãe, o tinha mantido afastado desde o nascimento, na obra homónima de Aldous Huxley. Mas se a exclamação inocente de John exprimia ao início uma admiração genuína por um mundo perfeito que mais parecia uma utopia, ela enche-se de sarcasmo à medida que o selvagem descobre os elementos distópicos que sustentam aquela ilusão de eficácia e paz social: o hedonismo baseado no sexo estéril e promíscuo e no consumo regular e público de psicotrópicos, que afastam a depressão e a conflitualidade sociais. Foi esta a inspiração do único trabalho editado pelo colectivo hamburguês Brave New World, em 1972, com “Impressions On Reading Aldous Huxley”, numa tentativa de fazer a interpretação musical dessa descoberta.
Mas o longínquo futuro distópico que a obra de Huxley criou nos anos 30, não estaria mais tão distante quando, nesse início da década de setenta, o grupo de Herb Geller e do irlandês John O’Brien-Docker, entre outros experientes músicos locais, decidiram criar este disco que, por ser uma actualização daquela obra satírica, reflectia subtil e indirectamente uma visão crítica dessa sociedade de consumo que já tão bem conheciam. Numa época em que se tornava comum fundir os vários estilos musicais, este disco misturou também o jazz ao rock psicadélico, passando pelas inovações da electrónica e até por uma inspiração medieval, reunindo para o efeito uma parafernália de instrumentos acústicos e eléctricos que deram uma tonalidade muito peculiar a este álbum singular no panorama do rock de vanguarda feito na Alemanha dos anos 70. Mas apesar da diversidade e estranheza de estilos e arranjos instrumentais, a sua conjugação é feita de um modo coerente e consistente com o carácter alucinatório dos paraísos artificiais criados por Aldous Huxley.
Depois de um curto prólogo, com uma introdução dominada pela flauta, “Alpha, Beta, Gamma, Delta, Epsilon” apresenta, num registo simultaneamente futurista e groovy, que combina os sons electrónicos com os sopros de Reinhart Firchow, a sociedade de cinco castas que compunha o World State da ficção de Huxley. “Lenina”, a rapariga conformada, mas infelizmente apaixonada pelo inconformista Bernard, serve de inspiração à improvisação “easy listening” da faixa seguinte. É então que o álbum assume a sua motivação psicadélica, com “Soma”, o nome da droga que aliviava e alienava a população desse Admirável Mundo Novo. Aqui o disco abre-se à experimentação acústica dos efeitos de estúdio e aos sons mais inusitados do “stylophone”. A “Halpais corn dance” serve como uma transição narrativa colorida de influências étnicas para um lado B bem mais negro e trágico. É com a longa faixa “The End”- que aliás escutamos já em fundo - que o álbum desenvolve as suas qualidades cinemáticas, revelando o dramatismo implícito desde o seu início. A orquestração é densa e complexa, lembrando de certo modo o neo-classicismo vanguardista do grupo de rock belga Univers Zero, mas com um espectro tímbrico mais alargado e uma tendência improvisacional mais jazzística. Por fim, o epílogo relata, na voz de um narrador, o isolamento fatal de John the Savage num farol, afastado daquele Admirável Mundo Novo que acabara por repugná-lo. Mas por agora, fiquemos com a faixa do lado A: “Alpha, Beta, Gamma, Delta, Epsilon”.

Tracklist:

1. Prologue (1:01)
2. Alpha Beta Gamma Delta (7:38)
3. Lenina (4:21)
4. Soma (5:18)
5. Halpais Corn Dance (3:24)

6. The End (17:42)
7. Epilogue (1:28)

Labels:

0 Comments:

Post a Comment

<< Home